Entrar no quarto era como
mergulhar no mais intenso breu; o único som que preenchia o ambiente era o
silencio ensurdecedor, o suor era uma essência constante e a indiferença se
fazia tão presente que já era considerada parceira de cativeiro. Andava de um móvel
á outro sem tropeçar em absolutamente nada, fizera tantas vezes o caminho entre
a porta e ela, e passava tanto tempo ali dentro que já havia decorado o lugar
que cada objeto ocupava; ás vezes se permitia sair para comer, beber ou ir ao
banheiro, e ás vezes esquecia-se completamente dessas limitações humanas e
dedicava sua atenção inteiramente á ela. Tentou por vários dias conversar,
agradar ou envolve-la, mas nada do que fazia era o suficiente para conseguir
sua atenção; contra o silencio esmagador cantava, quando o desanimo reinava ele
a presenteava e quando se sentia extremamente bondoso dava-lhe noticias do
mundo; mas ela permanecia imóvel na cama evitando comer, beber ou respirar. Com
o passar dos dias a pele dela deixou de ser macia, o cabelo agora sem cachos
perdeu a cor, os olhos o brilho, os lábios a espessura que tanto o atraia e seu
corpo as curvas que o impeliu a cometer esse sequestro. No terceiro mês, foi se
compadecendo dela e a soltando aos poucos, tirou as correntes que lhe prendiam os
braços agora finos demais, depois as que prendiam os calcanhares machucados,
parou de lhe cortar as unhas que costumavam afundar em sua carne e por fim
tirou-lhe a mordaça. Aos poucos ela foi se acostumando ao lugar e a sua
presença, andava de um móvel a outro sem tropeçar em absolutamente nada, voltou
a comer, beber, respirar e a falar; sua pele recuperou a maciez, o cabelo
enrolado agora brilhava e o corpo novamente com curvas pertencia somente a ele
nas noites de solidão. Passava os dias deitada em seu colo falando sobre si e
seus sonhos que repentinamente passou a envolvê-lo; cantava quando o silencio
era esmagador, presenteava quando o desanimo reinava e dava-lhe noticias do
mundo quando se sentia extremamente bondosa.
segunda-feira, 23 de março de 2015
quinta-feira, 19 de março de 2015
Liberdade (Semi-voo)
Postado por Tempus em quinta-feira, março 19, 2015 com Sem comentários
Certa vez, um homem dirigiu-se
para a beira de um abismo, e cansado das neuras cotidianas despe-se e deixa-se cair
sem medo nos braços do escuro, sem se importar com detalhes fúteis como: Onde iria
parar! Ansiava a liberdade indecorosamente e por essa razão, quando sentiu o
vento bater em seu rosto e envolver delicadamente seu corpo nu, fechou os olhos
e saboreou cada pedaço amargo desse novo sentimento. Assim, deixou-se ficar por
um tempo curtindo aquele salto que aparentava ser infinito, somente despertando
desse estado de letargia quando seu corpo atinge violentamente o solo. Uma dor
estonteante o invadiu quando os ossos de suas pernas, braços e tronco se quebraram;
abre os olhos demoradamente sem poder pensar em nada, sem sentir medo e sem ver
a vida passar diante de seus lindos olhos verdes; segundos depois se da conta
de que ira morrer e isso o entristece profundamente; desejava poder aproveitar
mais a sensação de liberdade que experimentara durante a queda, e embora a dor
em seu corpo seja dilacerante, ainda assim a leveza do “quase voo” persiste em
povoar a sua mente. De repente começa a rir desenfreadamente, estranhando não
ver o peito subindo e descendo durante a respiração que entrecorta, o sorriso
se formar nos cantos da boca e se alargar e a barriga sacudindo a cada espasmo
do corpo. Adorava esse processo. De
qualquer forma, não conseguia conter essa vontade insana de rir, então continuou
nessa tentativa dolorosa de felicidade gargalhando tão alto e tão forte quanto
seu corpo quebrado permitia; parando somente quando o excesso de sangue o fez
engasgar. Olhou para o alto a fim de enxergar o Céu, mas nada viu além da insistente
escuridão, passou a língua nos lábios sentindo o gosto do sangue e da amargura que
lhe adoçavam a boca e curtiu mais um pouco aquela sensação de paz. Momentos
antes de morrer vê uma pena de sua própria asa planar e pousar em um dos cachos
de seu comprido cabelo loiro dourado; tenta abri-las com o que resta de suas
forças, mas só consegue balançar as pontas, e então falece, se perguntando por
que nunca as usou.
terça-feira, 17 de março de 2015
Amor (Someone for everyone)
Postado por Tempus em terça-feira, março 17, 2015 com Sem comentários
A prostituta não tem valor
significativo; desfila de um lado á outro na rua vendendo aquilo que possui de
melhor, como um camelô desesperado ela se anuncia com afinco e veemência, e quando sente
que nada mais tem a oferecer simplesmente vende o corpo. Em geral a
prostituta não tem alma; sacrifica seus amores, engole o choro obedientemente e
mantem a boca sempre cheia e fechada; se for preciso ela força o sorriso e abdica
do prazer pessoal. Jamais perde tempo porque tempo é dinheiro. Ás vezes é agredida
por um ou cem, mas não há como saber se dói ou magoa porque ela não é como nós,
feita de sentimentos, carne ou osso, não tem vontade própria, gosto ou opinião social.
A prostituta não adoece, não vai ao banheiro, não sente ciúmes e também não sofre
por desilusão amorosa; como bailarina em caixa de musica ela vive de ocasião,
dançando silenciosamente quando lhe permitem e só se expõe na mídia dentro de
um singelo caixão. A prostituta da prazer a quem pedir sem pensar em dizer não,
mas tem as melhores roupas, a melhor tecnologia, frequenta as melhores festas e
contempla os melhores céus; com olhos castanhos, verdes ou roxo; ela enxerga o
mundo como uma enorme cama, então se deita em qualquer calçada, se espreguiça
em qualquer bar e descansa eternamente em qualquer esquina. A prostituta não pertence
a ninguém, ela é simplesmente um alguém para todos.
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