RSS
Facebook
Twitter

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Microconto - 11

De repente, sentiu que todo o peso do mundo recaia sobre si, e não podendo mais se segurar, caiu, e quebrou; deixando escapar as preciosidades que havia guardado em seu intimo.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Microconto - 10

Inundada de amor falou tudo, falou boca, falou língua e falou dentes; falou olhos chorosos, abraços apertados e sorrisos não correspondidos, cartas, musicas e versos perdidos, falou a honra e o desespero. Falou até o coração partido.

domingo, 7 de dezembro de 2014

Nanoconto - 09

Sem palavras estreitou-a em seus braços, e quando se sentiu pronto desfez o abraço consciente de que embora não sua, ela finalmente seria feliz.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Verso - 26

Como explicar a saudade que sinto de mim mesma, quando olho nos seus olhos?

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Verso - 25

Quero te tomar,
Me embeber em sua essência,
E me enroscar em seu abraço;
Distorcer o seu sorriso,
Te lamber,
Morder
E devorar cada pedaço de seu corpo,
Até que não sobre mais nenhum pedaço.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Frase - 02

Em casa de ferreiro;
O espeto é de pau,
As janelas de vidro,
As portas estão abertas
E o coração sempre exposto.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Microconto - 09

Espantado, olhava-se no espelho da vizinha sem reconhecer a própria imagem; toca em sua face com a ponta dos dedos sentindo a pele macia e barbeada, contempla o cabelo bem cortado e os olhos castanhos conformados. Distraído, recorda sem nitidez da época em que se empenhava para ser o espelho do mundo; e envergonhado, chora ao perceber que deixara o sonho morrer ao se contentar apenas em se envaidecer no espelho de alguém.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Frase - 01

Só sei que nada sei,
E mesmo que eu soubesse
Não sei se seria prudente dizer.

domingo, 16 de novembro de 2014

Microconto - 08

Um dia quando as bocas se encontraram, uma onda de amor os invadiu violentamente, os corações acelerados doíam no peito e ao se mirarem perceberam que até aquele momento nunca tinham se visto; a urgência em se consumirem diminuiu junto com as diferenças, o abraço, os pequenos gestos, as manias e os defeitos de repente passaram a ser mais importantes que o desempenho na intimidade; era parte deles, do que os tornava fortes, do que os unia e do que mantinha o sentimento vivo.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Verso - 24

Como me desfazer desse abraço
Que nos funde,
Nos confunde
E nos integra?

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Verso - 23

Indescritível,
É o momento em que você me beija,
E tinge meus lábios
Com sua doce ilusão.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Microconto - 07

Trancado no quarto sentia-se incomodo com sua refém; e já cansado de perambular pensativo entre um móvel e outro e de dizer-lhes insanidades cruéis, deita-se suspirando em seu colo macio e familiar, e evitando aqueles calmos olhos castanhos, chora copiosamente, finalmente conseguindo a atenção que jamais foi sua.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Microconto - 06

Disposta a esquece-lo;
Chorava em cima da ultima carta de amor,
Apagando inescrupulosamente
Cada letra que a compunha
Com suas lagrimas desamparadas.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Microconto - 05

As palavras enroscaram-se na língua,
Ecoaram na boca,
Debateram-se nos dentes,
E desfizeram-se num expirar contido
Antes que sufocasse seu orador.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Verso - 22

Gosto;
Quando minha boca encosta na sua,
E você me conduz
Num doce sorriso.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Verso - 21

Esse difícil exercício
De alimentar-me de amor,
É o que tem sustentado
Meus vagos versos de solidão.

sábado, 18 de outubro de 2014

Microconto - 04

Á beira da morte
E cansado de metamorfosear sonhos em palavras,
Liberta-se de sua prisão encadernada;
E decidido á mergulhar em seus sonhos,
Veste-se com a realidade
Para preencher o vazio de sua vida.

(Em parceria com Manu Muni)

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Poema - 04

O que pensar do vento
Que leva em um sopro contido,
Os pedaços de meu leviano coração,
Que insiste em quebrar
Toda vez que você vai embora?

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Poema - 03

Tenho medo de preencher esse vazio com poesia;
E esses versos
Devorarem minha mente,
E me fazerem esquecer cada detalhe seu,
Que é a inspiração,
Que formam as palavras,
Que compõe os meus poemas.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Verso - 20

Não amo nada que tomo por leviano,
Mas tomo levianamente,
Tudo o que penso que amo.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Verso - 19

Tomo por certo tudo o que amo;
E amo, por certo,
Quase tudo o que tenho.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Poema - 02

Sem medo de viver de ilusão
Me estreito em seus braços,
Inteiriço ou aos pedaços,
Vou sem consciência de excesso ou insuficiência,
Mergulho nu
Me deixando afundar,
Afogar
E absorver sem a minima culpa.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

O ultimo conto

Desculpem-me, mas hoje vocês são a historia.
Vocês leitores são o mais sensacional que pode existir dentro de uma estória: Vibram, dão sentido, vida, ênfase e ideias que nem mesmo o criador ousou ter.
O ultimo conto são vocês! Seus sonhos, caráter, suas façanhas, as doces e loucas memorias, as tristes lágrimas e os mais raros sorrisos; então, se explorem, se conheçam a fundo, se reinventem, se permitam e vivam intensamente. Façam histórias dentro do coração do mundo, criem estórias para outros sonharem com vocês, espalhem-se para que as pessoas não esqueçam a preciosidade que vocês são, e cresçam, para que vocês nunca duvidem da capacidade que possuem.
Saibam que não é possível viver para sempre, mas é surpreendente quando conseguimos deixar em tudo e em todos uma gota de nós.
Mas não se limitem em ser meras historias, sejam livros raros para que eu tenha o prazer de coloca-las na minha estante, e como boa leitora vou absorver cada palavra de suas aventuras com a finalidade de não mais esquece-las, e como boa contista vou me inspirando em vocês para novas criações.

Sejam grandes, e acima de tudo; - Sejam felizes!.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Verso - 18

Ahhhh .....
Seus olhos;
São de um negro tão inebriante,
Que se decidida mergulho,
Me afogo logo de prazer;
E sem protestos
Me deixo engolir e eternizar.

Verso - 17

Anseio desesperadamente
O arremedo de paz
Que só encontro no vazio de seu abraço.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Inexplicável

De repente suas lembranças me invadem a mente e já não posso mais ficar quieta; debato-me nas paredes de meus sentimentos ao lembrar de sua boca ser uma aquarela deliciosamente linda, e de sempre pintar meus lábios com seus beijos; minha boca até então apática, agora exala uma escala infinita de cores. Nosso épico abraço na chuva também é algo que não posso esquecer, foi exatamente nesse momento em que o mundo ficou gelado, mas eu permaneci quente por causa do seu amor, e de repente me dei conta de que já não era mais quem pretendia ser. Eu sou melhor se junto a você.
Ando de um lado a outro inquieta remoendo sua falta, te vejo em cada canto, em cada esquina e em cada olhar; tento dormir para me desligar mas se fecho os olhos você ainda esta lá, ás vezes no pedaço mais escuro de meu coração, outras vezes no pedaço mais claro; e a vida segue sem paz; meus olhos verdes sempre a te procurar, meu fraco coração batendo em desespero, e nossas gatas Whiskey  e Lola também a sofrerem. Em algumas noites as flagro deitas no tapete em frente à porta ansiando seu regresso, então me deito entre elas e me ponho a esperar pacientemente acarinhando entre suas orelhas. Não consigo me livrar de ti mesmo que tente.
Ontem, finalmente joguei fora todas as nossas fotos juntas, de tanto olhar elas perderam o significado, ficaram vazias de sentimentos e tornaram falsos nossos ilustres momentos; as viagens, as brigas, as festas surpresas, parecem agora fazer parte de um passado remoto pintado a guache. As lagrimas de saudade que caíram nelas deixaram marcas, manchas, escorreram e se derramaram molhando o chão; então decidida, ensaquei nossas lembranças e sai á comprar uma Hasselblad H4D – 200MS para um dia registrar outros momentos. Perdoe-me!

Essas são as ultimas linhas que escrevo relatando sua amarga ausência; vou assinar, selar essa carta e coloca-la em cima da cama junto com as outras quatorze; a mesa já esta posta para o jantar, as velas acessas, as gatas no tapete á esperar e meu coração bate ansioso. Tudo esta como deixou. Estou em nostálgica. Ouço seus passos ecoando na escada e sua respiração cada segundo mais próxima, meu corpo anseia seu abraço e minha boca quer colorir-se mais uma vez. Que bom que voltou. A vida não tem graça sem você!

Verso - 16

Para onde será que vão os beijos que jogo no ar?
Pousam desesperados de boca em boca,
Ou vagueiam solitários,
Até encontrarem a sua?

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Verso - 15

De hora em hora
Vou distribuindo sem pudor meus sentimentos,
E espalhando-os insensatamente.
Em demasia,
Com vontade,
E sem medo;
Para que o mundo engasgue com esse excesso de amor.

A carta

A carta foi planejada com esmero, e cada palavra escrita fazia parte de um conjunto de sentimentos expostos, gravados em folhas brancas num ato insensato de amor; foi revisada, passada a limpo, relida, lacrada e beijada carinhosamente pelo remetente. Nos primeiros raios da manhã atravessou a cidade decidida, foi selada, paga e enviada com ansiedade e insegurança. Antes da metade do dia a carta foi recebida com surpresa. A cautela se fez presente no rompimento de seu lacre; e a curiosidade também; uma vez aberta, espalhou pela casa suas promessas, dizeres e essência, causando mais comoção do que o pretendido. Suas folhas marcadas por dobras foram amassadas por mãos tremulas, borradas e manchadas por lagrimas de alegria, beijadas num súbito ataque de amor renascido e sufocadas no peito em chamas e de respiração urgente do destinatário. Acompanhava cada batida desritmada do coração ao qual era pressionada, e quase fora rompida com a vibração de 200bpm. A carta foi mirada uma ultima vez, invertida enquanto a mão que a segurava secava os olhos, recolocada no envelope e guardada embaixo do travesseiro. Não presenciou o reencontro entre remetente e destinatário, e tampouco suas juras de amor incontroláveis; mas durante a madrugada ficou presa entre travesseiro, lençol e colchão quando as amantes finalmente consumaram seus sentimentos; em dado momento fora lançada inconscientemente ao chão, então deixou-se atingir o solo sem dar-se conta de que o amor somente fora possível devido a sua existência

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Despejo (por Vera Lucia)

Hoje achei-me na rua,
Com velhas coisas, trapos juntados
Numa existência  qualquer.
Fui despejada da casa da poesia.
Achei-me na rua.
Vi de repente erguerem-se
Paredes de palavras aladas,
Protetoras do meu ser
De vestes coloridas e ricas.
De ecos maravilhosos parecidos com a infância.
Ergueram-se e me fizeram feliz e rica ali.
Escrevi  e vivi.
Exaltei-me.
E novamente encontro-me no desamparo
Da rua.
Vislumbro daqui a casa fechada.
Espero o dia em que novamente
A porta se abrirá para mim.

Verso - 14

Para onde será que vão os beijos que jogo no ar?

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Nanoconto - 08

Dormia a sonhar com sereias, e acordava preso em sua própria rede.

sábado, 27 de setembro de 2014

Verso - 13

Amar,
É uma forma desajeitada
De sermos quem no fundo desejamos ser,
De olharmos com inocência para o outro
E de nos espalharmos sem culpa
pelo mundo!

You are my girl

O nascer do Sol só fazia aumentar sua aflição, passara dois anos sonhando com esse momento e agora que estava por acontecer não sabia como fazer, pensou em agir naturalmente mas estava desesperada demais para tal coisa; afinal de contas iria revê-la.  Antes de sair do carro olhou-se mais uma vez no espelho alisando repetidamente o comprido cabelo negro com a palma da mão; retocou a base no rosto branco, conferiu o brinco, repintou o lápis nos olhos e ajeitou o relógio que ela lhe dera de presente em seu 21º aniversario. Entrou no prédio onde ela morava, atravessou o saguão, enviou-lhe um sms para avisar que estava subindo e roboticamente chamou o elevador; esperava em frente á porta do elevador batendo o pé direito no chão num ritmo imaginário, enquanto os dedos da mão esquerda tamborilavam em seu quadril seguindo o mesmo ritmo, de vez em quando ajeitava o cabelo atrás das orelhas sem se dar conta do próprio ato. Entrou no elevador perdida em si mesma.
Sentia que sua impaciência aumentava de forma incontrolável, tinha a impressão de que demoraria uma eternidade para chegar ao 15º andar, suas mãos suavam, suas pernas tremiam, seu peito apertava, os dentes roíam violentamente as unhas, o ar lhe faltava e seu coração batia tão forte que lhe doía o peito; todas as lembranças que guardara das duas juntas se remexiam em sua mente e a deixava desnorteada. Seguia nessa crise de ansiedade crescente quando o elevador teve uma falha técnica; estava tão envolta em seus sentimentos que demorou um tempo para perceber que ficara presa exatamente no 15° andar. Fitou firmemente o painel de vidro e esperou que a porta abrisse, mas nada aconteceu; o elevador permaneceu imóvel, estático como seu amor por ela e estagnado como sua doce ilusão. Uma gota de suor passeou por sua espinha vertical, tremeu no momento em que seu deu conta de sua triste situação, - Estou presa na droga do elevador., constatou em voz alta e com olhos verdes arregalados.
Duas horas depois respirava com dificuldades. Estava sufocando; a caixa metálica que media L.1100 mm x P.1400 mm a mantinha encarcerada e longe de seu único amor, esperara muito para revê-la e agora mesmo perto parecia imensamente longe. Sentiu-se idiota ao lembrar que se separara dela quando descobriu que era uma porn star; não podia dividi-la mesmo sabendo que não se deitava com outros por amor; abandonou-a sem prévio aviso, e jamais pôde esquecê-la. Encostou-se na parede procurando apoio quando o painel, o corrimão, o espelho e as portas começaram a girar juntos, transformando-se num carrossel infernal, apoiou as mãos nos joelhos, o lugar estava cada vez mais quente e as lembranças se debatiam nas paredes de sua mente. Lembrava-se de ouvir mensagens de amor deixadas diariamente na caixa postal, e pedidos de desculpas desesperados; eram sinceros e carregados de saudade e pesar, doía-lhe ouvir a voz tão chorosa, mas era orgulhosa demais para admitir que também a queria de volta. Dois meses depois as declarações e as desculpas cessaram, e para seu total desespero ela sumira de vez; procurou-a por dois anos se sucesso, e já estava decidida a desistir quando finalmente conseguiu seu numero de celular; ficou surpresa em perceber que ela não lhe guardara magoas, então marcou de ir em seu apartamento na manhã seguinte, e desde então não pôde mais se concentrar, comer ou dormir. Ainda estava apaixonada.

O suor e as lagrimas escorriam-lhe pela face borrando a maquilagem feita com esmero, o ar foi tornando-se cada vez mais difícil de consumir e sua visão cada vez mais turva, ajoelhou-se levando uma mão ao peito e apoiando a outra no chão, - Falta pouco para abraça-la., dizia a si mesma repetidamente tentando manter a calma; de repente a doce voz de Christine soou do outro lado fazendo com que  a ansiedade a invadisse por completo; deitou virada para a porta sem poder mais sustentar o peso do próprio corpo, o peito doía por conta da ausência de ar, engolia em seco e chorava com a intensidade que lhe era permitida; antes de perder completamente a consciência ouviu a porta do elevador abrir, e um segundo depois pôde assistir Christine gritar em pânico ao vê-la caída ; com o que lhe restava de energia construiu um cansado sorriso e satisfeita desfaleceu sem urgência.

Quando finalmente abriu os olhos, estava no quarto e na cama de Cristine; assustada, tentou-se levantar mas foi impedida pelo cansaço, então virou para a esquerda e a viu sentada a seu lado; o rosto pálido, sardento e carregado de preocupação estava próximo o suficiente para um beijo doce e desavisado; estar assim tão perto aumentava a necessidade que vinha sentindo dela desde as 03h00min AM, diminuía sua ansiedade descontrolada e aplacava o louco palpitar de seu coração. Podia sentir seu hálito de chiclete de menta, seu cheiro natural, curtir a pele macia enquanto ela segurava sua mão e se espelhar em seus olhos castanho claro. Ela era sublime!

Respirou fundo e contemplou-a pacientemente como se a visse pela primeira vez, se prendeu em detalhes objetivando gravar na retina cada pedaço de seu ser, viu-a suspirar de prazer inegável quando rapidamente lhe contornou os lábios com dedos impacientes; e quase enlouqueceu de satisfação quando em seguida ela lhe tracejou cada linha do rosto com o dedo indicador. Sem poder se conter beijou-a delicadamente no rosto e enroscou as mãos tremulas em seu cabelo ruivo, em seguida abraçou-a docemente e quase enlouqueceu de tanta saudade; suas aflições e lembranças às abandonaram, permitindo que novas memorias fossem construídas a partir de ali. - Eu te amo! A frase dita quase ao mesmo tempo pelas duas ecoou por todo o quarto, se espalhando no ar e rebatendo nas paredes preenchendo todo o local em segundos; a magoa, o ressentimento, a desconfiança, a frustração e a decepção foram esquecidos no momento em que elas se beijaram; sem culpa sanaram a saudade, e entre olhares e abraços dormiram satisfeitas.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Verso - 12

Amo suas inebriantes palavras de amor,
Que atravessam o espaço,
Desaceleram o tempo
E me alcançam,
No segundo em que começo a pensar em você.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Contrato

Diante da folha em branco, a escritora se reinventava compulsivamente para criar uma ultima estória, a cada palavra ela se sentia mais motivada e a cada frase construída experimentava uma sensação diferente.  Já era madrugada, e apesar de estar exausta mantinha o sorriso no rosto, tinha urgência em terminar essa serie e por isso escrevia febrilmente. De vez em quando interrompia a escrita e se flagrava admirando-a distraidamente, ela era uma dessas pessoas que nada tinha de especial, falava com um jeito manhoso mas não era carinhosa, gostava de ter propriedade em assuntos que nem ao menos conhecia, às vezes estreava o seu mau-humor como quem estreia um vestido novo e tinha o habito detestável de mascar chicletes e andar descalça. Enquanto a olhava, reanalisava os motivos que a levaram a escolhê-la, mas por mais que tentasse não podia entendê-los; só sabia que a escolhera e que por mais que ela a irritasse estava feliz com sua escolha.
Deitada no sofá podia sentir o olhar que lhe pesava em cima, era modelo profissional e ás vezes prostituta de luxo tinha cinco anos, e nesse interim recebera inúmeros convites, alguns com intenções perigosas e outros definitivamente estranhos mas nenhum como esse. A escritora que agora a observava era sem duvida a pessoa mais intrigante e adorável que já conhecera; abordara-a em seu ultimo desfile e pedira que se hospedasse quinze dias em sua residência por uma determinada quantia, a principio pensou em recusar mas a curiosidade lhe pegou desprevenida então aceitou; afinal de contas não é todo dia que convidam uma prostituta de luxo para ser objeto de estudo.
Na manhã seguinte chegou de malas e instalou suas manhas, mau-humor, tagarelice e manias detestáveis, tirando da escritora a paz a qual estava tão acostumada; acordavam cedo e trabalhavam a serie, uma escrevia enquanto a outra contava detalhes necessários e desnecessários de sua vida pessoal. Quando se sentia entediada, a modelo desfilava descalça por toda a casa, cantando, xeretando, ouvindo, interferindo e mascando trident global connections deitada no sofá; às vezes num surto reclamava sobre sua vida e chorava amargamente suas escolhas, nesses momentos a escritora se aproximava silenciosamente e a envolvia num forte abraço. Deixavam-se ficar assim, abraçadas com olhos fechados até que os cheiros trocassem de corpos.  
Havia momentos em que apenas conversavam trocando confidencias, contavam sobre família, amigos, antigos relacionamentos, comidas preferidas e decepções amorosas; em geral eram parecidas e ao mesmo tempo antagônicas, uma mistura que contrariando as expectativas pessoais dera certo. Às vezes a modelo lia os contos criados sobre si e ficava surpresa com a doçura usada para relatar sua conturbada vida, outras vezes era a escritora quem se surpreendia com a quantidade de problemas que essa carregava sozinha. Foram trocando experiências e manias, e permitindo que o tempo às carregassem despercebidas, foram se curtindo, se permitindo e se desesperando com a ideia da despedida.
No decimo quarto dia de sua estadia a modelo redefiniu o conceito de insuportável, não quis comer ou beber, mascar ou xeretar, e limitava-se em responder com monossílabos a qualquer tentativa de dialogo; passara o dia todo de pijama no sofá olhando a escritora trabalhar incansavelmente. Ao cair da noite foi convencida a comer um pedaço de pizza e a beber um pouco de agua, e ao terminar reassumiu seu posto no sofá recusando-se a dormir na cama. Em sua mesa a escritora tentava entende-la sem sucesso, decepcionada, investiu compulsivamente em seu ultimo texto parando apenas para admirar distraidamente sua beleza. No fundo desejava que ela acordasse com melhor humor, queria servir-se de seu abraço mesmo que fosse o ultimo; mesmo não sabendo lidar com despedidas.
No dia seguinte as duas se trataram como completas estranhas, uma angustia muda passeava entre elas feito visita indesejada; evitaram o abraço de adeus assim como qualquer coisa que o tornasse concreto, então encarceraram os sentimentos e encerraram sua estória com um aperto de mão. Mascando chiclete a modelo entra em seu carro sem olhar pra traz, não queria expor seus sentimentos para que esses não fossem escritos; ligou o carro devagar e finalmente olhou para ela usando o espelho retrovisor interno mas só viu a porta aberta e vazia, deu a partida e chorou como quem perde alguém importante. Nunca fora tão difícil deixar um cliente.           Dentro da casa o tic-tac do relógio a incomodava em demasia, lembrava o irritante barulho que ela fazia enquanto mascava chicletes, olhou para o sofá vazio e foi invadida por uma enorme tristeza; sentou-se na cadeira mais próxima olhando de um lado a outro estranhando a solidão. O silencio na casa era esmagador. Aos poucos o ar foi lhe faltando até tornar-se quase impossível respirar, seus ombros caíram devagar e as lagrimas vieram involuntariamente rolando por seu rosto e molhando seus pés descalços.
Apoiada nos joelhos ela se desesperava com a verdade que lhe invadia, - Eu a amo, disse se assustando com a própria voz; sentia falta dela de um jeito quase impossível de explicar, queria tanto ter lhe dado o abraço de adeus e pedir que ela ficasse, mas não a abraçara e não pedira e agora tudo que sobrara era seu cheiro sumindo no ar e detalhes escritos a mão. Sua mente estava tão bagunçada quanto uma pagina de rascunhos, as lembranças e os sentimentos se fundiam formando um turbilhão dentro dela, e o desconsolo a abraçava forte tentando superar o amor; aos poucos se deixou afundar na cadeira e ficou imóvel como um livro abandonado.   – Também te amo!, ouviu a voz que invadia a sala e não pode conter a felicidade quando a viu parada na soleira da porta sorrindo amavelmente, levantou-se e atravessou o cômodo atônita; sentiu-se insegura enquanto caminhava mas enroscou-se em seu abraço disposta a consumi-la agora que sentia o amor de que tanto escrevera; queria estreá-lo, prova-lo e curti-lo. Queria tudo com ela!

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Nanoconto - 07

Era desinteressante como uma rosa de cera, e ainda assim era parte essencial da vida de alguém.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Dias (por Bruna Portugal)

Tem dias,
Que o silêncio é a melhor resposta para os nossos pensamentos.
Tem dias que queremos ficar só, 
Contemplando nossas lembranças e os belos momentos.
Tem dias que nada queremos além de nos mesmos,
Pois tudo se torna vago e inviável diante do nosso espelho.

Verso - 11

As possibilidades e os limites,
Se digladiam ininterruptamente
Nas paredes de sua mente.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Verso - 10

A inconstância de sentimentos,
É o catalisador principal
Do mundo de fantasias,
Criado por um poeta amador.


quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Microconto - 03

Tudo nela exalava vida;
Seu cheiro,
A pele morna,
Os olhos vivos,
E o coração que batia desenfreado por mim.

Boneca de Luxo

Assim que trancou a porta do banheiro da suíte olhou-se no espelho, tinha o lábio inferior inchado e dolorido, mas ainda assim insistia em passar o batom vermelho, cada toque era um choque de dor insuportável que a fazia se encolher e errar o local da pintura; esperava conseguir cobrir os cortes e esconder os hematomas, mas sabia que não ficaria perfeito como o lábio superior. Na mão esquerda a garrafa de The Dalmore Trinitas bebida até a metade, balançava perigosamente em cada soluço de choro, e a cada instante precisava fazer mais esforço para mantê-la presa entre seus finos e compridos dedos.
Serviu-se de um largo trago da garrafa como quem beija apaixonadamente, e recebendo nova onda de dor encarcera o liquido na boca; quinze segundos depois respira fundo, endireita o ombro e repousa a garrafa no balcão da pia voltando sua atenção para a maquilagem. Com mãos tremulas, mune-se de um lápis mal apontado e tenta contornar os olhos entre um vacilo e outro, o lápis dança da direita pra esquerda marcando rudemente seus finos traços e aumentando o numero de arranhões em seu rosto.
No bolso do roupão da Victoria’s Secret, o IPhone 4S de Diamante toca insistentemente mas ela não atende; com os olhos castanhos fixos em sua imagem no espelho, engole a bebida que esquecida na boca fazia o rasgo em sua língua arder; o liquido que agora é uma mistura nojenta de whiskey, saliva e sangue lhe provoca forte ânsia e a obriga a se ajoelhar babando.  O mundo lhe parecia um lugar terrível. Com um impulso senta no sofá ao lado do espelho cobrindo a cabeça com as mãos, e em seguida gargalha como louca até o riso transformar-se em choro desesperado; quando finalmente se acalma, alcança a garrafa e volta a beber.
Num surto, ajeita o roupão e se analisa no espelho: lábios machucados e borrados, dentes manchados de batom vermelho, olhos mal pintados e quase fora de orbita, mãos e braços arranhados e o cabelo ruivo natural despenteado.  Secou desajeitadamente as lagrimas. Gargalhou mais uma vez só pra ter certeza de que não estava de todo triste, mas seu hálito inflamável lhe provoca nova ânsia. Passado o enjoo, levanta e se prepara para deixar o banheiro da suíte de luxo, então escorrega na garrafa e machuca o pulso quando se apoia na porta. Ignora a dor. – Precisa parecer feliz Rachell, precisa parecer feliz...! Repetiu seguidamente em voz baixa até a frase perder o sentido.
No quarto o cliente a espera deitado e sorrindo, parecendo não se importar com os ferimentos que havia lhe causado; assim que a vê deixar o banheiro, levanta da cama e se aproxima devagar saboreando cada segundo de desespero que estava provocando. Sem dizer palavra retira de sua carteira R$ 500.000,00 para pagar o programa, joga o dinheiro para o alto e a derruba com um safanão. 
Entre resmungos e soluços seus olhos foram fechando, a dor amenizando, a cabeça ficando mais leve, a vida voltando ao foco e a chuva de dinheiro caindo. Tranquila ela vai se perdendo dentro de si, como se fosse um labirinto complicado de sair. O tapete no chão foi esquentando, e se ajustando ao formato de seu corpo enquanto o dinheiro espalhado lhe dava uma falsa sensação de sobriedade. – Volto semana que vem, disse o cliente roubando-lhe a breve paz.    – Estarei te esperando., responde ela procurando outra garrafa de whiskey.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Microconto - 02

Desesperado,
Abraçava-a com força
E beijava-lhe a boca,
Tentando inutilmente sugar de seu corpo
A tão odiada inocência.


Verso - 09

E essa solidão que de tão rente
Me atende,
Me entende,
E me veste
Como roupa antiga que se ajusta confortavelmente no corpo.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Monólogo do ex-poeta (por Ygor Pierre Piemonte Ditão)

Quente tarde de Setembro nesta metrópole comedora de gentes que é São Paulo. Tornei-me mais uma das milhões de quimeras que coexistem comigo. Sou um poema totalmente diferente dos demais. Sou uma poesia não escrita e sem intérpretes. Sou um fragmento do imaginário que se concretiza na plenitude das alucinações. Fui subvertendo-me integralmente e afastando de tudo para me encontrar. Na busca de me entorpecer embebi toda a minha alma nas blandícias seculares a fim de compreender as buscas inauditas dos homens. Queria ser como os demais. Queria, eu juro, ser como o bonde de pueris ignóbeis que nem amadureceram, mas já se embalsamam em uísques baratos, cigarros falsificados e vinhos de boteco. Tentei de maneira cega não ver a loucura sórdida desse mundo sem pé e sem cabeça: maldição da minha terra circular. Nunca sei onde começa ou onde há de terminar. Todavia, afastei-me de todos os meus sonhos e como se bebesse com Descartes neguei todas as minhas verdades (fé, inclusive) para experimentar todos os mandamentos imperiais dos meus iguais (que conseguiam ser mais diferentes que qualquer outra espécie). Deitei-me com esse grupo ensurdecedor de ensandecidos nos fatídicos discursos panegíricos insípidos e não consegui de maneira alguma ver algo que me preenchesse. Assisti de perto (e participei de algumas) festas de embrutecimento da alma e minha existência foi se diminuindo tanto que deixei de existir. Sim, isso é possível. A inexistência ocorre quando persisto sendo como não sou. Bebi noites atrás de noites e despojei-me de todos os meus limites morais, éticos e alguns legais. Recordo-me de madrugadas de insônia e do dedilhar de um piano velho. Era mais uma noite paulistana. E eu: uma poesia repetida. Queria ser um verso de Bukowski, mas nunca fui. Após tantos séculos preso na cadeia de buscas inócuas decidi buscar a mim mesmo. Eu era simplesmente aquilo que neguei. Fui me identificando naquilo que ninguém quis ser. Era sou a poesia não escrita no banco do velho jardim. Fui afastando os espaços e aproximando as distâncias até sentir dentro de mim o toque repentino da fênix, o galope irrefreável do velho pegasus, a mensagem secreta de Hermes, as setas clandestinas do Cupido. É estranho. Quando nas balburdias das aventuras juvenis deitei-me com a multidão de meus pecados a fim de execrar toda a ojeriza que eu tinha no homem, eu me encontrei. O caminho prosseguiu calmo e eu já não tinha mais nada a buscar. A vida me dera tudo que um homem podia esperar. Quase tudo, na verdade. Passei dos versos repetidos à poesia inédita na quente noite de nosso encontro. Quando te busquei nas insanas noites de alucinação, quando de procurei nos botecos acinzentados dessa prostituta urbana ou quando te esperei nas sarjetas entupidas de destilados... Você não me apareceu. Contudo, quando meus nortes se direcionaram as buscas totalmente diversas e quando eu já havia encontrado em mim mesmo razões totalmente alienígenas de existência, você me tocou os olhos e me aveludou o espírito. Hoje, ao olhar pela janela, vou contemplando a cidade de uma maneira diferente, pois ela me deu você quando dela eu me enfurecia. Eis, portanto, fascinante ironia: São Paulo foi minha primeira professora do bem cego, ou seja, do bem praticado para aquele que te repugna. Aprendi contigo que o rebelde tempo é prudente professor, só me concede aquilo que quero quando tenho a maturidade que preciso. Hoje já não posso me chamar poeta. Já não tenho os dramas dos demais, porque troquei a montanha-russa de emoções pela serenidade da prosa que me deste com o teu olhar... 

Encontro e Desencontro (A esperança)

Corria sem saber ao certo se a encontraria, já eram 10h30min AM e estava atrasado mas ainda assim insistia em ter esperanças, tinham se conhecido um dia antes na livraria e ela despertara nele algo que já não sentia havia tempos, ou que talvez nunca tivesse sentido. O encontro dos dois foi como um desses inexplicáveis, se olharam e cinco segundos depois já sabiam que se queriam mesmo antes de trocar palavras. Marcaram de se ver as 10h00min AM do dia seguinte dentro da livraria.
Agora parado na porta, a ideia de encontra-la deixava de fazer sentido. - Porque mesmo eu deveria entrar nessa livraria? Falava sozinho. -Talvez devesse desistir! Lembrou-se que nem ao menos a conhecia. – E se ela não estiver lá? A chuva o acalmava. - Vou entrar. Chocou-se com ela ao se virar; passado o susto seus olhos verdes finalmente a enxergou, ela era linda, que de tanto lhe calou o discurso metodicamente ensaiado; seus cachos loiros estavam desfeitos pela chuva, a pele alva e salpicada de nascença fazia contraste com o dia chuvoso de nuvens cinzentas e sua boca rosada e entreaberta lhe roubava o pedido de desculpas. Ela me lembra alguém, pensou. Por fim não pôde fazer mais que olhar, então ela sorriu aquiescendo, ele retribuiu o sorriso e ambos se olharam silenciosamente como se não se vissem desde muitas décadas; então ele a abraçou sem desviar o olhar, e naquele momento, cada qual lutou internamente com seus medos, solidão, suas magoas e desilusões. Não disseram nada um ao outro, talvez não quisessem estragar o momento, talvez só não soubessem o que dizer.
Do outro lado da rua Rachell assistia a tudo desolada, passara a noite em claro pensando nele e sabia que precisava se declarar, já fazia cinco dias que o olhava suspirando e toda vez que o via sentia que era capaz de curar-lhe a tristeza. Pela manhã, arrumou-se e saiu dominada pela esperança de finalmente poder abraçar o seu primeiro amor; mas quando chegou o abraço que tanto sonhou ganhar já tinha sido oferecido a outra. Desconsolada e remoendo cada palavra não declamada, deixou-se molhar pela chuva, e sem poder ir embora ficou olhando-os caminhar até que esses viraram um ponto difuso em meio à multidão.
Na esquina um cachorro escapara e avançava em um idoso, dois carros colidiram enquanto um caminhão desviava de cinco crianças que distraidamente atravessavam a rua no farol fechado, alguém praguejava ao perder o ônibus, mas eles iam tranquilos e abraçados. Não pararam, não fizeram menção de voltar e nem sequer a notaram do outro lado da rua
Em seu apartamento e sem se importar com nada ela foi se servindo dele devagar e deliciosamente, em cada beijo, em cada olhar e em cada toque, como quem toma o mais refinado vinho; lá pelas tantas da madrugada e já embriaga de beijos e caricias entregou-se sem a menor cerimonia. Ele, rendido desde a porta da livraria, só queria perder-se no calmo castanho de seu olhar e aos poucos foi se entregando, confiando e se enroscando em seu calor; o amor o consumia mais do que ele permitia e juntos foram sorrindo, sentindo e se fundindo no silencio.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Nanoconto - 06

Estava tão cansado de viver, que deitou-se para um cochilo e entrou em coma profundo.

domingo, 14 de setembro de 2014

Verso - 08

Estranho
Como meus versos só ganham sentido
Se ditos pelos lábios teu.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Innocence

Rachell Rios era uma adolescente recatada, que aos 15 anos não conhecia as maldades e malicias da vida, nascida e criada em cidade pequena, os pais a protegiam de tudo, de todos e até das verdades da vida. Não frequentava a escola como as outras crianças e tampouco tinha professor particular, aprendia o que precisava com a mãe e o resto ficava por conta dos livros de instruções.  – Quanto menos contato melhor. Era o que dizia seu amado pai.
A menina se contentava com pouco por não saber o que era o muito, e sempre encontrava prazer nas pequenas coisas da vida. Acariciava sua gata Lola, sonhava com o cantar dos pássaros, retribuía se um idoso lhe sorria da janela e quando podia sair de casa se deliciava assistindo as crianças brincarem; às vezes quase atingia o ápice da satisfação ao conversar com alguém enquanto tomava um sorvete, e outras vezes ficava mortificada por não poder ajudar quem precisasse. Era um ser solitário de alma pura e transparente.
Seu pai Robin Rios era empresário e colecionador compulsivo de filmes, um ex-militar de fala grossa e personalidade difícil, quando se decidia por algo ninguém o fazia mudar de ideia. Ao saber que era pai de uma garotinha ficou atônito, sabia que vivia em um mundo cheio de maldades e malicias; e assombrado pelas lembranças da guerra, decidira por educar a filha em casa e priva-la das desilusões, mas a menina ficara tão inocente que ele já não sabia se realmente tinha tomado à decisão certa.
Sua mãe era o oposto, mulher linda e elegante, postura digna de primeira dama, falava manso e deixava qualquer homem imediatamente rendido; o que ninguém além do marido sabia, era que essa discreta mulher fora uma promissora modelo e estrela de filmes adultos que cinco dias após conhecê-lo abandona os sets partindo o coração de milhares de fãs; com uma aliança no dedo e o sonho de uma vida mais digna, Scarlett Rivers some para o mundo e deixa nascer Julianne Rios.
Algumas vezes e sem poder evitar, ela abandona a dona de casa exemplar e cede lugar á aposentada Scarlett Rivers para a satisfação do marido e talvez até para a própria; domada pela sombra do passado, dança jogando os cabelos enquanto seus olhos brilham de prazer ao ver a malicia servir de mascara para seu amado que consumido pela impaciência de cliente apaixonado se atraca a dançarina com saudade insaciável.
Certa noite, acordando de um pesadelo a inocente Rachell ouve vozes vindo do quarto dos pais, e temendo ser uma briga decide verificar o que estava acontecendo, ao perceber a porta entreaberta aproxima-se sorrateiramente para não alerta-los, sabia que o pai a protegia de tudo e não lhe diria se fosse realmente uma discussão. Esperava ver os pais de pijamas conversando ou esbravejando, mas flagra dois amantes envoltos no passado. A mãe com calma angustiante rebolava de joelhos em cima do pai, seus cabelos negros soltavam no ar um cheiro inebriante enquanto balançava e suas costas nuas se arrepiavam de prazer; o pai embaixo assistia a tudo como um telespectador idiotizado e rendido. A menina naturalmente maravilhada, se retira em silencio para não interromper-los, o medo do pesadelo agora insignificante, dá espaço ao que identificou como um misto de prazer e adoração.
Na manhã seguinte ainda impressionada, comenta o ocorrido com o pai e recebe a explicação de que tudo era parte de uma dança que a esposa o estava ensinando. Julianne chocada com as mentiras cada vez mais ridículas, tenta falar a verdade para a filha mas Robin a interrompe bruscamente. Mais tarde tenta convencer o marido, de que já era hora de a menina crescer, mas esse não faz caso e engrossa a voz dizendo que para ele Rachel será sempre sua garotinha e da à conversa por encerrada. A esposa lamenta!
Nas tardes de Sábado os Rios tinham por habito se reunir na sala para conversar e assistir filmes, às vezes quebrando a rotina a família convidava um ou dois casais de amigos para jantar, e assim Rachell tinha a sorte de poder interagir com garotos de sua idade sob o olhar atento do pai; e mesmo controlada, se deliciava com as historias e estórias que seus amigos instantâneos contavam para impressiona-la; mas desta vez seus pais a deixaram sozinha em casa e ela não teve opção a não ser ver filmes com sua gata, foi até a coleção particular de Robin e decidiu-se pelo filme “My Girlfriend”, distraída com as manhas de Lola não percebeu que o filme não correspondia à capa, só se deu conta do fato quando na tela aparece o titulo em francês: “Journal de la vilaine fille”. Ficou surpresa em não reconhecer o nome, mas sabia que seu pai sempre adquiria títulos novos e que nem sempre guardava os filmes nas capas corretas, portanto não estava surpresa; acomodou a gata em uma das almofadas do sofá e dedicou toda a sua atenção á produção.
O filme era um desses de roteiro fraco e conteúdo nulo, onde duas pessoas supostamente formando um casal compõe o elenco inteiro, e depois de quarenta minutos de frenética interação corporal os atores suados e cansados, sorriem felizes por fazerem parte de um titulo de sucesso. “Journal de la vilaine fille” era mais uma produção independente  gravada em Home Studio, mas para a telespectadora involuntária nada disso tinha importância porque ela só tinha olhos para a atriz principal.
A atriz. Rachell nunca a vira tão linda, os cabelos longos era uma fina cortina de seda negra que lhe caiam pelos ombros e desciam pelas costas brancas só para enroscarem em sua fina cintura, os olhos verdes claros brilhavam de prazer e sua boca carnuda hora vermelho natural, hora branco artificial roubava de seu parceiro a merecida atenção. Os dois se enroscavam ardentemente quase esquecidos da câmera, ela ou ele por baixo, eles de lado ou em pé, não fazia diferença; qualquer posição encaixava-os perfeitamente. Falar ou respirar ficava cada vez mais difícil, então limitaram o dialogo á gemidos ininteligíveis, olhares significantes e quando possível um sofrido esfregar de língua que caracterizavam como beijo. Era demoníaco.

A garota sem ter noção de pornografia e que por natureza se encantava facilmente, não podia piscar de tanta admiração, nunca vira nada tão lindo quanto aqueles movimentos, eram exóticos e fascinantes, extravagantes e definitivamente encantadores. Instantaneamente lembrou-se da mãe dançando gloriosamente para o pai, e um segundo depois se levanta do sofá com o rosto iluminado, e como quem tem todo o tempo do universo, retira caprichosamente suas roupas e põe-se a dançar com inocência quase obscena no olhar; momentos depois Robin e Julianne entram na sala e deparam-se com a filha nua e ardendo de alegria, reconhecendo-se na televisão e sem saber o que dizer, ela atravessa a sala e cobre a filha com seu casaco, mas decidida, a menina retira o manto dos ombros e para desespero do pai aponta para a tela e anuncia sorrindo: - Quero ser dançarina!

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Microconto - 02

Cansado,
Observava sem interesse a garrafa cheia;
E com gestos robóticos embriagava-se,
Estonteando a garrafa
Com seus beijos de solidão.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Nanoconto - 05

Fingindo não ser pecado, comeu sem pudor da arvore da vida. 

Verso - 07 (Abraço)

Os braços se enroscam,
O beijo cala,
O cheiro irradia
E o coração alivia
No segundo em que os olhos se fecham.

domingo, 7 de setembro de 2014

A espera

Julianna era um misto de cansaço e tristeza, o pouco que conseguia dormir era para sonhar com o marido que partira para a guerra sem saber que seria pai, sentia imensamente sua falta e não passava um dia sem pensar nele. A casa vazia a deixava desesperada mas não queria deixa-la por medo de que ele não a encontrasse quando voltasse, então ficou a esperar na janela todos os dias sem se cansar. Quando soube que estava gravida ganhou novo animo, sonhava com o momento em que contaria a novidade para o amado e esse radiante de alegria a envolveria em um abraço apertado declamando seu amor; e assim sonhando estava quando chegou a noticia de que ele desaparecera em combate. Alguns meses depois da noticia, dera entrada no hospital com o coração partido e a bolsa amniótica rompida, o liquido que escorria por suas pernas lhe tirava do posto de vigia e lhe roubava a esperança.   
Enquanto amamentava olhava o neném com ternura e tentava decorar seus trejeitos, procurava na filha algum vestígio de si mesma, mas a menina nascera com pele pálida, cabelo loiro avermelhado, rosto sardento e olhos castanhos claros; nada tinha dela, nem ao menos o sorriso; tentou lamentar o fato mas desistiu, não se sentia preparada para lamentar qualquer coisa referente a essa criança, nem mesmo a total semelhança com o pai. O cansaço a dominava cada vez mais e tornava quase impossível organizar seus pensamentos, desejou ardentemente que o marido estivesse ali para segurar-lhe a mão, mas já não tinha esperanças de que ele ainda estivesse vivo; quis chorar e não conseguiu, fizera isso tantas vezes nos últimos nove meses que não lhe restava uma lagrima sequer, nem de alegria e nem de lamento. Estava vazia!
Fazia um esforço sobre-humano para manter os olhos abertos, então presenteou a filha com um beijo na testa e de coração apertado permitiu que a enfermeira a levasse. Sozinha no quarto encolheu-se preguiçosamente no leito tomada pelo sono, e olhando instintivamente para a porta viu seu marido parado com olhar apaixonado e flores nas mãos; sem saber se era desejo ou realidade adormeceu sorrindo... Amava rosas brancas!

sábado, 6 de setembro de 2014

Verso - 06

Gosto de passear meus dedos em seu corpo,
E contornar cada detalhe
Enquanto me perco no caminho
Que vai do calcanhar a sua mente.

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Microconto - 01

Determinada,
Dava passos cegos e esperançosos na escuridão;
Ansiando encontrar
A lendária luz no fim do túnel.

Através do olhar (Despercebidas)

A lente roubava a pureza da cena, não que fizesse intencional, mas ainda assim era fria e desumana ao registrar aquele momento. Os moveis ao redor, a ultima roupa da moda, o cabelo bem penteado e a maquiagem impecável, escondiam de forma gloriosa a tristeza que as modelos traziam em suas almas. De olhos fechados, cada qual tentava em vão superar a magoa e esquecer o motivo que as mantiveram separadas por quase um ano inteiro; as mãos suavam, os corpos tremiam, os corações as traiam e a saudade se dilatava incontrolavelmente. Mas a câmera não pôde ser mais e nem menos humana, e lhes exigia profissionalismo. Abraçadas, ruiva e morena tentavam se transfundir, se misturar e difundir; o amor implícito limpava os pensamentos, adoçava as bocas e lhes transbordava a alma. Nada mais importava. Desapercebida, a lente deixou que a hora e a volúpia passassem despercebidas, e o coração se acalmou, o abraço se desfez e a magoa interrompeu indecorosamente o único olhar sincero. No fim, restou á elas um beijo gelado com a duração de um piscar, e tudo terminou em um click; a lente se fecha caprichosamente lhes roubando o tempo, os sentimentos, a intimidade e a dignidade de um coração partido. A foto revelada no dia seguinte, dissolvia a perfeição do momento e inseria no amargor uma infinidade de significados.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Nanoconto - 04

Recebia tantas flores de seus admiradores, que mudou convenientemente sua dieta para rosas vermelhas.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Os dizeres

Voltava do enterro com o coração partido, a aliança ainda no dedo anelar da mão esquerda parecia ter 200 quilos agora, mas ainda assim não queria tira-la, tentava manter-se forte por isso não derramara nenhuma lagrima desde que vira o corpo no chão. Andava sem rumo dentro do apartamento indo de um cômodo a outro sem objetivos e evitando a todo custo o quarto do casal; o terno preto que usara no enterro o estava sufocando, e sem opções enfrentou por fim o aposento. Tudo estava igual. A cama arrumada, as roupas dobradas, os casacos pendurados e os chinelos alinhados lado a lado; abalado sentou-se na cama do lado onde ela dormia, e quando se inclinou para cheirar o travesseiro viu a carta em cima do criado mudo, hesitou um momento antes de tocar no que poderia ser seus últimos dizeres; ainda não se sentia preparado para aceitar a morte dela. Fechou os olhos respirando fundo e pegou a carta prendendo o ar involuntariamente. Olhou em volta e a lembrança dos últimos momentos que estiveram juntos no apartamento o tomou de assalto. Era insuportável!
-Mas é meu aniversario!, a exclamação soou quase inaudível. Fingindo não ouvir ele pegou as malas, beijou-a roboticamente nos lábios e saiu do apartamento em silencio e determinado a viajar. Do elevador pôde vê-la encostada no batente da porta com uma carta na mão, seus olhos castanhos e tristes o encarava, a boca apertada segurando um ultimo protesto e a mão parada no ar como se tentasse alcança-lo. Tentou dizer-lhe algo mas desistiu, abaixou a mão e limitou-se a deixar as lagrimas se manifestar por ela, então a porta do elevador se fechou bruscamente, interrompendo o momento intimo e desagradável. 
Vinte e cinco minutos depois ele ainda estava sentado na cama, imóvel e perdido em amargas lembranças, segurava a carta com a mão esquerda como quem tenta segurar o ultimo fio de vida, enquanto a mão direita tentava em vão socorrer as lagrimas que despudoradamente lhe descia a face; e assim deixou-se ficar por mais um tempo até esgotar toda a sua angustia. Quando finalmente se acalmou desdobrou o papel com cautela, esperava ler algo que justificasse aquele aparente suicídio, talvez um pedido de desculpas ou uma reclamação... Quem sabe uma declaração! Leu e deixou-se magoar aos poucos, abaixou a cabeça, encurvou as costas e soltou os ombros; o peso do corpo de repente tornara-se insustentável, então largou-se de vez na cama desejando não mais poder acordar. Inocentemente, a carta planou da mão ao chão despercebida e caiu aberta como se não mais pudesse guardar seus segredos; em letras perfeitamente desenhadas ela revelava os dizeres que lhe arrebatou a alma: “Let this reach you and keep you warm; my love hasn’t budged. Come home! Karli.”.

(Deixe alcançar e manter você aquecido; meu amor não se mexeu. Volta pra casa!)

Prosa - 01 (A outra metade de mim)

Fazia-Me falta isso.
Essa expectativa insana de te conhecer,
Algo simples como um amor platônico,
Que não tem obrigação alguma de acontecer.
Faltava-Me esse acréscimo
Com o poder de modificar Minha rotina
E de arrebatar Minha pureza,
Esse algo que de tão cuidadosamente escondido
Roubava-Me de quem em segredo amo tanto ser.
Intimidava-Me,
Amedrontava-Me,
Confundia-Me.
Faltava–Me esse alguém
Que de tanto Eu desejar
Fazia parte de Mim como uma personalidade oculta.
Um pseudônimo que há tempos argumentava em vão sua vontade de sair,
De se sobressair,
De ser individual e vivo.
Incorporar esse outro é como usar um habito,
Uma segunda pele,
Um instinto de sobrevivência,
É assassinar Doctor Jekyll e assumir Mister Hyde.
Faz-Me redundante.
Um maldito pleonasmo.
Torna-Me um subjuntivo.
Esses, que odeio tanto falar e ouvir.
Insere-Me em um contexto deliciosamente estorico,
E Me faz ser ainda mais complexo.
Mas ao mesmo tempo é tão efêmero,
Que chega a ser doido, torturante e poético.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Nanoconto - 03

Sua beleza inefável roubava de Narciso a dignidade da morte.

Verso - 05

Quando estou contigo,
O mundo
Se transforma em uma síntese
De tudo o que é belo.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Cinco dias sem ela (Jogos de Solidão)

Primeiro Dia: A morte.
Tudo parecia confuso, meu tímpano ainda vibrava com a força da onda sonora que serviu de mensageira fúnebre, sempre pensei que tal noticia se desse de forma especial, mas nesse caso foi feio e grosseiro; tão rude quanto o próprio acontecimento.  Quando cheguei o corpo ainda estava no chão, seu comprido cabelo loiro avermelhado indevidamente tingido de vermelho-sangue, a pele alva e salpicada de nascença fazia contraste com o piso preto, seus olhos castanhos miravam o vazio com desejo ardente enquanto a boca entreaberta convidava para o mais intimo segredo. Num impulso coloquei minha orelha próxima a seus lábios; esperava ouvir um ultimo sussurro, mas esse já me tinha sido roubado, segurei suas mãos entre as minhas numa ultima tentativa de união, fechei seus olhos, também fechei os meus e finalmente lhe dediquei um minuto incomodo de silencio quando a beijei.

Segundo Dia: A fuga.
Corria as cegas pela calçada vazia, o vento forte levava docemente minhas lagrimas, deixando somente a magoa. Eu fugia sem rumo levando comigo só a obstinação. Às vezes olhava para trás, às vezes olhava para os lados, queria garantir que ninguém me seguiria; cada olhar uma paranoia e cada passo uma nova expectativa que me conduzia ao nada, mesmo assim me sentia confiante, deixava para traz o desespero, a tristeza, a agonia, a solidão e qualquer outro sentimento que me amarrasse ao passado. Fugia de mim mesmo e ainda assim me sentia livre... Finalmente livre! Livre! Repetia para me convencer enquanto corria cada vez mais rápido. De repente tropecei numa pedra e cai violentamente no chão, o ar me faltou por alguns segundos e meu nariz doía (não mais que meu ego), o desespero me oprimia. Virei de costas para o chão tentando decifrar o Céu, as nuvens assumiam formas estranhas aquele dia, um gato, um navio e um homem deitado olhando para o alto. A calçada estava vazia, sem plateia para ajudar ou vaiar, meu espetáculo tinha sido um fiasco e minha camisa estava molhada. Sangue? Não... Era só a agua da rua; escorria da calçada para a sarjeta e desta para o bueiro
                        levando minha felicidade,
                                                                       minha esperança  
                                                                                                       e minha confiança.
                                                                                       Voltei pra casa; ainda tinha minha solidão.


Terceiro Dia: A rotina.
Viver tornara-se um martírio; eu não podia ou não mais queria acompanhar aquela dinâmica enjoativa, pessoasconversasandançasrotinaconvivencia pausa pessoasconversasandançasrotinaconvivencia. O mundo era um Carrossel infernal, sem musica, sem risos, sem luzes, sem cor e eu com ganas de desligar. Tentava sonhar desesperadamente enquanto dormia e também tentava quando acordava, mas sonhar não era mais fácil e continuar sem ela também não. Procurava sua delicadeza nas flores, nos perfumes sua essência e no arco-íris suas cores, mas nada no mundo se equiparava a ela. Sumira por completo! Era como quando era casada comigo; não existia. Em desespero invadi o local de sua morte; seu cheiro ainda pairava no ar e o contorno de seu corpo jazia mal feito no chão, eram as únicas coisas que me restava. Deitei ao lado do desenho com a esperança de que ela aparecesse de repente e me abraçasse, mas apenas a vida me abraçara, cada vez mais forte, cada vez mais intensa e cada segundo mais sufocante. Fui embora com a urgência de um amante flagrado!

Quarto dia: A livraria.
Ainda me sentia desanimado mais precisava sair de casa, fazer algo além de contemplar o teto branco, nos últimos três dias essa tinha se tornado a minha atividade mais frequente, ao ponto de branco se tornar minha cor preferida; talvez porque não inspire nada, ou talvez por ter me acostumado a olhar. Meus olhos arderam com a saudação da Luz e meus ouvidos reagiram da mesma forma com o som da vida, inspirei fundo e me nauseou o cheiro do mundo, carros, cigarros, prostitutas, incêndio... Quem podia sentir falta disso? Eu podia! Entrei em uma livraria, precisava de cinco ou seis títulos que me distraíssem, ou que servissem de desculpas para me encarcerar novamente; as opções eram infinitas. Passeava entre as palavras e me atracava hora com frases, hora com citações; às vezes ouvia os versos sussurrados pelos amantes dos livros e depois tentava eu mesmo sussurra-los, parecia minha primeira vez na cidade grande. Tentava me perder entre as estantes, mas só me perdia em mim, por isso quando a vi já era tarde demais, embora ela tenha me visto em tempo. Olhamo-nos rapidamente e depois nos demoramos, mas ela já estava de saída e a atendente começara a me ajudar. Eu queria muito lhe sorrir, mas não soube como fazer, e ela ficou na porta, parada, me olhando insistente e esperando por algo que eu não soube lhe dar. Provavelmente queria aquele sorriso mais do que eu. Deu de ombros e saiu. A atendente acompanhava a cena enquanto empacotava os livros, em seguida me deu o troco, a nota e uma informação: - Seu nome é Sabrina e ela voltará amanha as 10h00min AM. Fingi não ouvir, estava cansado demais pra ter esperanças.

Quinto dia: A Necessidade

A necessidade dela me invadiu essa manha antes mesmo dos primeiros raios de Sol, não se preocupou com educação e sem cerimonias foi me adentrando; do topo da cabeça á planta dos pés se acomodou sem explicar os motivos de fazer-se presente; implantou ideias, destilou sugestões, culminou lembranças e semeou a saudade. Instalou-se sorrateiramente e logo tornou-se emergente. Hora se fez real, hora feito ilusão; a necessidade transformava-se para meu prazer, se satisfazendo e me inibindo. Amante dos jogos de solidão ela revelou-se; intensa e única esfregava em mim seus longos cabelos ruivos, olhos castanhos vivos, sardas espalhadas por todo o corpo pálido e sorriso encantadoramente vermelho. Agarrei-me a essa solida ilusão com ganas, e rendido fui me deixando seduzir; suas garras passeando por meu corpo e me envolvendo caprichosamente, acalmando minha mente confusa, selando meus lábios vermelhos, acariciando meu liso cabelo negro e cegando meus olhos verdes. Desesperado de amor vou me deixando morrer sem resistência, devagar, deliciosa e delicadamente vou me unindo a ela quebrando a tristeza; findando minha rotina de lamurias como um verso vazio de poeta fingidor, que deita pra um descanso e falece afogado em seu miserável amor.

Verso - 04

De prazer se morrem os amantes, quando somente os beijos já lhe não são mais o suficiente.

Verso - 03


Amizade apaixonada
É como degustar uma sobremesa;
Você prova cada pedaço devagar,
Sente o coração acelerando,
E suspira de olhos fechados,
Desejando que nunca mais acabe.

sábado, 30 de agosto de 2014

Verso - 02

Meu amor por ti é raro.
Lendário.
Único.
É um fator histórico
Que só se vive uma vez.
É como saudade,
Que só "existe" em português.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Preludio

Acendia o 15º cigarro e o quarto fechado estava repleto de fumaça, já nem era mais possível enxergar as fotos da infância nas paredes, tentava ver desenhos nas nuvens de fumaça e como não conseguia fingia que cada uma era uma nuvem de pensamentos. Nenhuma luz entrava no aposento. Respirar dentro do nevoeiro ficava cada vez mais difícil, mas não desistiria tão fácil da asfixia. Sorriu envergonhada, sabia que jamais daria certo morrer assim.
De costas para o chão remoía sua frustração. - Sou invisível! Disse em voz alta para sentir-se menos sozinha. Cinco anos depois de ter casado, ainda não se acostumara com o fato de ser sempre largada no dia de seu aniversario e em outras datas importantes, abrira mão de tudo pelo marido inclusive de si mesma; era cansativo. Ignorando o celular que tocava dentro da bolsa, acendeu outro cigarro e engatilhou o revolver.
No andar de baixo sua mãe preocupada embrulhava o presente de aniversario, amava a filha e por isso odiava vê-la tão triste, queria desesperadamente subir e nina-la mas não tinha coragem de bater na porta. Aposto que esta deitada no chão (pensava), sempre faz isso quando se chateia, objetos e superfícies geladas a acalmava; o toque do celular interrompera seus pensamentos, pela musica já sabia que era o traste do genro. Falou rápido e sem se preocupar com educação ou bom senso, queria mesmo era tirar a filha de dentro do quarto, estava aflita sem saber a razão, subiu pulando alguns degraus. Demorou-se alguns segundos antes de bater, ainda tinha duvidas quanto a interromper o confinamento, respirou fundo e bateu na porta com força exagerada; em resposta ouviu um tiro.       - Ahhhh... Largara o celular com o susto. Estava em pânico.
 Do outro lado da cidade o marido de Karli desistira de ir viajar, era aniversario de sua mulher e pela primeira vez em cinco anos queria passar a data com ela, não a amava mais, a maioria das vezes nem a notava, mas já tinha percebido que ela estava mais desanimada e ansiosa do que o normal. Não era fácil ser casada com ele.
Dentro do taxi, segurava as rosas com cuidado para não derrubar, ansiava ver seu sorriso. Podia até imaginar a cena: ela vindo em sua direção e o sufocando com um abraço saudoso. Rosas brancas. Sua preferida pensou, nunca conhecera quem gostasse mais desse tipo do que a esposa. A Rosa de Cera! Uma vez ela confessara que era parecida com a flor, quase invisíveis ela dizia mais para si do que para ele, ninguém se interessa. Sentiu vergonha de si; não gostou de ser ninguém.
A esposa não respondia as suas chamadas, então discou o numero da sogra que atendeu com humor indecifrável, dispensou as boas maneiras dizendo que passaria a ligação para a filha. Olhou para as rosas com afeto enquanto aguardava a transferência de mau humor, pelo menos esperava que a esposa estivesse de mau humor; mesmo assim queria falar com ela. Ouviu a batida na porta e sorriu satisfeito, depois um tiro e um grito somados ao barulho de um celular caindo; uma curva mal feita do taxista passou despercebida, desta vez não conseguiu salvar as rosas da queda involuntária; ficou estático olhando as flores espalhadas no chão.
Karli apontava o revolver para a própria testa, sua respiração estava descontrolada, não era fácil tirar a própria vida; mas já estava decidida. Pensando bem, poderia fazer isso em sua própria casa, a mãe não merecia ver tal cena e muito menos o pai, já o marido era outra situação, quem sabe assim ele finalmente a enxergaria. Tudo bem! Ia adiar a performance, demorou-se um pouco mais sentindo o metal gelado na testa, gostava de objetos e superfícies geladas porque a acalmava, gostava de rosas brancas e também de surpresas; sorria perdida em suas pequenas satisfações quando uma forte batida na porta a assustou, apertou o gatilho involuntariamente e em um segundo nada mais a entristecia.

Parada na porta do quarto a mãe reunia forças para entrar, talvez a filha tivesse errado e talvez não fosse um tiro; mas ao abrir a porta constatou que era um tiro e infelizmente a filha acertara. Não teve coragem de aproximar-se do corpo, encostou-se à porta e deixou-se cair pesadamente no chão; o sangue que escorria em sua direção a mantinha hipnotizada. Não percebeu quando o genro desceu do taxi, entrou na casa em total desespero, e invadiu o quarto tão pálido quanto uma rosa branca.