Assim que trancou a porta do
banheiro da suíte olhou-se no espelho, tinha o lábio inferior inchado e
dolorido, mas ainda assim insistia em passar o batom vermelho, cada toque era
um choque de dor insuportável que a fazia se encolher e errar o local da
pintura; esperava conseguir cobrir os cortes e esconder os hematomas, mas sabia
que não ficaria perfeito como o lábio superior. Na mão esquerda a garrafa de The Dalmore Trinitas bebida até a metade,
balançava perigosamente em cada soluço de choro, e a cada instante precisava fazer
mais esforço para mantê-la presa entre seus finos e compridos dedos.
Serviu-se de um largo trago da
garrafa como quem beija apaixonadamente, e recebendo nova onda de dor encarcera
o liquido na boca; quinze segundos depois respira fundo, endireita o ombro e repousa
a garrafa no balcão da pia voltando sua atenção para a maquilagem. Com mãos
tremulas, mune-se de um lápis mal apontado e tenta contornar os olhos entre um
vacilo e outro, o lápis dança da direita pra esquerda marcando rudemente seus finos
traços e aumentando o numero de arranhões em seu rosto.
No bolso do roupão da Victoria’s Secret, o IPhone 4S de Diamante toca
insistentemente mas ela não atende; com os olhos castanhos fixos em sua imagem
no espelho, engole a bebida que esquecida na boca fazia o rasgo em sua língua
arder; o liquido que agora é uma mistura nojenta de whiskey, saliva e sangue
lhe provoca forte ânsia e a obriga a se ajoelhar babando. O mundo lhe parecia um
lugar terrível. Com um impulso senta no sofá ao lado do espelho cobrindo
a cabeça com as mãos, e em seguida gargalha como louca até o riso transformar-se
em choro desesperado; quando finalmente se acalma, alcança a garrafa e volta a
beber.
Num surto, ajeita o roupão e se
analisa no espelho: lábios machucados e borrados, dentes manchados de batom
vermelho, olhos mal pintados e quase fora de orbita, mãos e braços arranhados e
o cabelo ruivo natural despenteado. Secou
desajeitadamente as lagrimas. Gargalhou mais uma vez só pra ter certeza de que
não estava de todo triste, mas seu hálito inflamável lhe provoca nova ânsia. Passado
o enjoo, levanta e se prepara para deixar o banheiro da suíte de luxo, então
escorrega na garrafa e machuca o pulso quando se apoia na porta. Ignora a dor. –
Precisa parecer
feliz Rachell, precisa parecer feliz...! Repetiu seguidamente em voz
baixa até a frase perder o sentido.
No quarto o cliente a espera
deitado e sorrindo, parecendo não se importar com os ferimentos que havia lhe
causado; assim que a vê deixar o banheiro, levanta da cama e se aproxima
devagar saboreando cada segundo de desespero que estava provocando. Sem dizer
palavra retira de sua carteira R$ 500.000,00 para pagar o programa, joga o dinheiro
para o alto e a derruba com um safanão.
Entre resmungos e soluços seus
olhos foram fechando, a dor amenizando, a cabeça ficando mais leve, a vida voltando
ao foco e a chuva de dinheiro caindo. Tranquila ela vai se perdendo dentro de
si, como se fosse um labirinto complicado de sair. O tapete no chão foi
esquentando, e se ajustando ao formato de seu corpo enquanto o dinheiro
espalhado lhe dava uma falsa sensação de sobriedade. – Volto semana que vem, disse o cliente roubando-lhe a breve paz. – Estarei
te esperando., responde ela procurando outra garrafa de whiskey.
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